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Para especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, o país perdeu tempo com o engavetamento do programa "Brasil 2040" e com a demora em adotar políticas amplas de adaptação às mudanças climáticas.
"O programa trouxe informações importantes, mas que pouca gente deu atenção, como esses cenários em que o Sul teria a tendência de chuvas acima da média e o Norte e Nordeste tendo redução hídrica", diz a coordenadora de Políticas Públicas do Observatório do Clima, Suely Araújo, à BBC News Brasil.
Ela também é ex-presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
"A gente perdeu tempo ao não tomarmos as medidas necessárias", complementa Araújo.
"O trabalho foi interrompido no momento em que a gente passava do diagnóstico para as medidas de adaptação. Os estudos nunca foram publicados. Fizeram um sumário executivo do programa com pessoas que não tinham ligação com os estudos. Foi um negócio jogado fora", lamenta Unterstell.
Suely Araújo explica que, em 2016, o governo brasileiro instituiu um Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima.
O plano foi lançado no dia 10 de maio de 2016, dois dias antes de Dilma Rousseff ser afastada do cargo em meio ao processo de impeachment do qual ela foi alvo.Araújo diz que, à época, o plano era bem desenhado, mas que faltou ser implementado.
"Ficou um documento tecnicamente bom, mas que ficou no papel", afirma.
Ela diz, no entanto, que a pouca preocupação com a adaptação às mudanças climáticas não é um fenômeno isolado.
"Lógico que isso piora em um governo negacionista como o do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), mas a subvalorização da adaptação é a regra, independente do governo", afirma.
Um relatório elaborado pelo Ministério do Meio Ambiente em novembro de 2021, durante o governo Bolsonaro, admitia a falta de recursos para a implementação do plano.
"Vários foram os desafios durante a implementação do PNA (Plano Nacional de Adaptação), dos quais mencionamos: a descontinuidade de ações iniciadas pelos setores e a escassez ou falta de acesso a recursos financeiros [...] a ausência de articulação, integração e sinergia interministerial e entre setores; e as dificuldades na implementação de programas e políticas específicas, dentre outros", diz um trecho do documento ao qual a BBC News Brasil teve acesso.
Suely Araújo defende que, para lidar com casos como as inundações do Rio Grande do Sul, o Brasil precisa de um plano ousado, com a previsão de investimentos de grandes somas de dinheiro a fundo perdido."Adaptação exige recursos e não tem como imaginar que municípios já vulneráveis possam se endividar para fazer as obras para se prepararem para os efeitos das mudanças climáticas. Tem que ser dinheiro a fundo perdido, porque o custo de reconstruir é muito maior que custo de prevenir", aponta Araújo.
Para o climatologista Carlos Nobre, que fez carreira no Inpe e participou do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) da Organização das Nações Unidas (ONU), os governos não vêm adotando as medidas necessárias para adaptar as cidades aos efeitos das mudanças climáticas.
"Esses eventos extremos vieram pra ficar. Eles não vão diminuir. Ao contrário, eles irão aumentar. E os governos, infelizmente, não estão fazendo os investimentos necessários. Adaptação não é apenas dar o alerta de uma tragédia. É, também, remover permanentemente as pessoas das áreas sob risco. E isso demanda dinheiro", explica Nobre à BBC News Brasil.